domingo, 30 de outubro de 2016

Harmonia Corporal

Certo dia acordei com o suor descendo pelo meu rosto e ensopando minha camisa. Me sentei na cama dura como pedra pensando em como minha cama havia endurecido em algumas horas. Esperei meus olhos se acostumarem ao breu do quarto e logo o que eu desconfiava se confirmou.

Não era meu quarto.

Me levantei e logo que meus pés descalços tocaram o chão senti o áspero piso de cimento, tomado por poeira e sujeira. Levantei os pés rapidamente e procurei por um chinelo, brigando com a escuridão.

Me levantei e procurei por um interruptor, mas em vão. Apesar de já estar enxergando alguns contornos, ainda estava muito escuro e aquele quarto era completamente novo pra mim, eu nunca havia estado nele.

Tentei abrir a porta e descobri que estava trancada, logo comecei a ficar realmente assustado, com o coração na boca. Pensei em gritar pela minha mãe ou pelo meu pai, mas antes mesmo de gritar por ajuda eu já sabia que eles não iriam me escutar, não ali.

Sentei no chão, já não me importando com a sujeira e comecei a chorar, chorar como um bebê, tinha o direito disso, afinal, ainda não havia completado nem 14 anos.

Mas, na verdade, o pânico de verdade ainda não havia batido, mas não tardou. Bateu quando eu estava ainda sentado chorando como uma garotinha, bateu quando eu passei a mão pelo rosto para secar o olho e senti a pele um pouco mais áspera, quando passei a mão pela cabeça e não senti meus cabelos ondulados, senti apenas um cabelo rente a cabeça e quase tão áspero quanto o chão. Abafei um grito. Eu era outra pessoa, ou melhor, estava no corpo de outra pessoa.

Isso já havia acontecido comigo algumas vezes, mas eram apenas flashes rápidos e incompreensíveis, nunca era nada como o que eu estava vivendo. Algumas pessoas acreditam que isso é um dom espírita, mas eu não acredito muito nessas coisas.

Me levantei e respirei fundo, tentando não entrar em pânico. Encontrei alguma coisa pontuda no chão, um pedaço de arame, imaginei, e sabe-se lá como consegui abrir a porta.

A claridade do outro cômodo me cegou por um momento, mas logo percebi que alguma coisa estava errada, eu não estava no meu tempo, no meu ano, talvez nem no meu século. Eu estava em uma casa antiga, parecia largada haviam anos, estava tudo empoeirado e o chão já havia ganhado uma segunda camada, esta de poeira.

Fui até um espelho enorme que estendia-se até o teto, sobrepondo-se a uma mesa com algumas fotografias de uma jovem branca com um filho de colo, depois essa mesma jovem pra lá dos quarenta anos com um rapaz negro e alto e no final da mesa apenas ela sentada em uma cadeira alta e com uma expressão extremamente triste no rosto. Mas o que chamou a minha atenção foi o meu reflexo escuro no espelho após eu jogar a poeira pro lado com a mão.

Eu era um garoto negro, com cicatrizes em toda a extensão do rosto, olhos inflamados (que só começaram a coçar depois que fiquei sabendo que estavam inflamados, incrível como é nosso cérebro), e uma orelha faltava um respeitável pedaço.

Mas não me demorei muito naquele reflexo, meus olhos foram parar na mesa, atrás das fotografias empoeiradas, em um diário de couro gasto e com um pedaço de papel pardo saindo pra fora. Abri o livro e percebi que o papel pardo era uma notícia recortada de um jornal antigo. Li rapidamente o título e o primeiro parágrafo da notícia:

"Negro é preso após assassinato de recém nascido"

"Brad Rockerty, 26, foi preso após confessar assassinato de Dollis Crossaint, 2 meses de idade, e tentativa de assassinato de Bella Crossaint, 22 an..." O restante do jornal estava rasgado.

Voltei minha atenção para o diário, onde frases desconexas foram escritas em letras rabiscadas:

"Encontrrrei B"

"D bem dorme muito"

"b está apanhando como um porco q é"

"b n vai cresser d nv n vai b criança"

"pretos morrem assaçinos"

"d está uma grassinha q amor"

Fechei o diário com repulsa, achando aquilo doentio.

Olhei ao redor da casa e percebi que havia uma porta que dava para a cozinha. Andei cautelosamente até lá e logo ao entrar senti o cheiro de podridão vindo de panelas há muito não utilizadas e nem lavadas, havia restos de comida pela mesa e pela pia. Me virei rapidamente para sair da cozinha, mas parei com um barulho que me causou arrepios, era um barulho rouco, próximo de choro e vinha de trás da porta do outro lado da cozinha. Abri a porta e ela rangeu em protesto, fui engolido pela escuridão e o cheiro de mofo.

Fui até a sala e peguei um lampião a gás que me lembrava de ter visto um tempo atrás. Voltei até a cozinha e percebi que o caminho que se estendia pela porta era uma escada longa e funda. Desci com cuidado e me dei parado de frente a uma porta de ferro, era dali que o som havia saído minutos atrás, havia alguém ali.

Se eu estivesse com a cabeça no lugar, teria percebido que a porta estava trancada por fora, mas não prestei atenção nisso, apenas abri a corrente e entrei. Passei direto pela porta e levantei o lampião e com o canto do olho vi uma cadeira de balanço com uma senhora. Me aproximei cautelosamente.
"Ola?! Senhora Crossaint?"

A senhora se balançou num esgar que pretendia ser um riso, que na verdade se transformou numa tosse carregada.

"Olha minha quer...rrida. Parece que o senhor Br...Brad veio nos visitar".

Ela olhou pra cima e deu um sorriso, expondo dentes podres e escassos. O riso se transformou numa gargalhada e logo depois em um acesso de tosse.

"Como ousa sair do seu quar...quarto seu preto imundo?" ela gritou "olha o que você fez com a pequena Do...Dollis!"

Foi tudo muito rápido, me lembro de ter caído no chão e batido a cabeça, mas antes de desmaiar me lembro daquela visão terrível. A velha senhora Crossaint levantou o que um dia foi sua filha, agora já em estado de decomposição completo e restando praticamente apenas os ossos. Depois disso apaguei. 

 Acordei um tempo depois com uma dor insuportável concentrada na parte de trás da cabeça. Mas quando acordei eu não era aquele pobre menino que havia sido pego por uma mulher que há muito já havia perdido a sanidade e o feito de Brad Brackart apenas por ser negro, eu não estava naquela casa assustadora, eu era apenas Daniel Alphonse, um garoto de 13 anos. O que sempre me passa na cabeça é se aquilo foi real ou apenas um sonho.

Apesar dos anos passados, eu nunca procurei saber se em algum lugar do mundo alguma Bella Crossaint existiu. Depois daquele dia, não tive mais sonhos em que eu me encontrava no corpo de outra pessoa e agradeço por isso.

Talvez eu jamais deva saber se aquilo realmente aconteceu, a linha entre a sanidade e a loucura é bem tênue e eu não quero coloca-la à prova.

Créditos a marvolors (Matheus Lavinas) por esta incrivel historia.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Serial Killers: Pedrinho, o matador.




Pedrinho “Matador” começou a vida com o pé esquerdo. O pequeno garoto nasceu com problemas no crânio por ter sido agredido pelo pai ainda na barriga da mãe. Cresceu assistindo cenas tão ou mais violentas que os mais sórdidos filmes de suspense, até que aos 14 anos de idade cometeu seu primeiro crime: matou o vice-prefeito da cidade onde morava. O motivo? O cara havia demitido seu pai, um guarda da escola municipal, acusado de surrupiar a merenda da molecada. Pouco tempo depois Pedrinho deu cabo à vida de outro guarda, que acreditava ser o verdadeiro ladrão da história.

Antes de completar 18 anos, o moleque já havia conquistado a mulher do dono de uma boca de fumo e assassinado uma penca de traficantes. Virou o pica da parada.

Mas sua amada acabou executada por policiais. Arranjou um outro amor, Aparecida, que mais tarde também acabou morta, dessa vez por traficantes rivais. O justiceiro foi fundo na vingança, torturando e matando mais um monte de gente que ele acreditava ter culpa por sua tragédia familiar. No fim da jornada, adentrou o casamento do suposto mandante do assassinato de sua mulher e deixou ali mais 8 vítimas fatais e vários feridos.

Acabou preso logo depois. Passou toda a vida adulta na prisão e lá empilhou mais uma quantidade enorme de novas vítimas. Entre elas o seu pai, de quem arrancou um pedaço do coração com a faca, mastigou e cuspiu fora. O castigo veio porque o velho esfaqueou a mãe do Pedrinho, que nunca deixou nada barato.

Ele possui uma tatuagem no braço esquerdo, que está escrito: Mato por prazer.

Assassinou dois companheiros de cela, um porque segundo ele "roncava demais", e outro porque não ia com a cara dele, segundo ele.

Ele se alto-denomina "justiceiro", pois segundo ele só mata quem merece.
Jurou de morte o "Maníaco do Parque", serial killer de São Paulo, assim, ganhando notoriedade no país.

Com mais de 100 assassinatos nas costas, Pedrinho é considerado o maior homicida brasileiro.

Vocês decidem.


quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Manual do Espelho

Broken-mirror.jpgEu havia me mudado para o pequeno apartamento da minha irmã, ela infelizmente foi presa por agredir um policial e como não tinha ninguém para ficar lá, cá estou, arrumando as coisas. Bem, não mudei muito coisa, já que ela era bastante organizada. Comecei então a bisbilhotar suas coisas pessoais. O notebook dela estava cheio de vídeos pornô baixados, algumas fotos de uma viagem curta e receitas de macarrão, porém nada de íntimo.

Depois de calmamente ter levado o note para o banheiro, resolvi ver se ela tinha algo escrito em seu caderno, pois eu adorava dedurar pra minha mãe os ficantes dela. Abri a bolsa da escola, livros pichados, caderno com anotações, nada de mais, até que encontrei um pequeno diário dentro dela. Ah, se eu peguei. Comecei a folear, entretanto, nada achei se não alguns manuais esquisitos. Parei de pular as páginas e decidi ler.


Como deve-se agir na frente do espelho.

1. Se o lugar ou ambiente tiver um espelho, mesmo que insignificante, passe direto por ele.
2. Se seu rosto estiver ferido ou sujo, você tem direito a olhar por 5 segundos.
3. Caso passar da marca de cinco segundos, aguente as consequências de seu ato.
4. Em hipótese alguma olhe nos olhos de seu reflexo.
5. Em hipótese alguma sorria para o espelho.
6. Você não pode quebrar um espelho, mesmo que este o atormente.

Fiquei meio grilado com isso, porém não achei que aquilo era sério.

Um dia, numa partida de futebol, tive um leve corte no queixo, voltei para casa para tratar o ferimento que sangrava um pouco, o único espelho que tinha naquele lugar era no banheiro, acima da pia. Cheguei lá, abri a torneira para me limpar da sujeira. Não sei o porquê daquele lugar ser tão frio, comecei a me observar , era um pequeno filete carmesim que caía, coloquei minha mão debaixo da água e passei no corte, enquanto realizava o ato, notei meus olhos brilharem no reflexo, eram um brilho tão ... maravilhoso, que me dá dava vontade de tocá-lo o dia todo, porém, apressado que sou, deixei o banheiro. Passei mais de 5 segundos.

O meu dia foi bem, almocei tarde, a comida era abundante e por isso acabei por me sujar todo. Impaciente, fui até a pia da cozinha, abri a torneira, porém a água não desceu, comecei a abrir mais, contudo nada de água sair, eu tinha pressa, já que teria prova, deduzi que o cano poderia estar entupido, então fui em direção ao banheiro. Estava tudo normal, a não ser um pouco de lodo estar nas extremidades do espelho, achei que por desleixo meu, não tinha percebido a sujeira e resolvi depois limpar. Cerifiquei-me que saía água e dessa vez, funcionou perfeitamente, primeiro lavei as mãos, sem precisar olhar aquele espelho, só que minha boca deveria estar toda engordurada - maldita receita de macarrão - e tive que observar, usei o sabonete, depois o líquido, apenas conferindo o meu trabalho em meu reflexo. Abri a boca, meus dentes estavam completamente sujos, com macarrão grudado até na gengiva, comecei a escová-los constantemente, até que pôs água na boca, gargarejei e cuspi no ralo da pia.

Por fim, dei um sorriso para averiguar a situação, ninguém pode descrever o que senti.

O sorriso estava um pouco mais espaçado do que eu realmente exercia, afinal, havia algo de errado nesse espelho, a única coisa que comecei a pensar era como aquilo era pequeno e nada atraente, forcei os cantos da boca, para sorrir ainda mais, enquanto minhas bochechas eram contraídas em relevos de minha pele, estava admirado, mas era como se, ao mesmo tempo, estivesse em um transe macabro. Eu nem sequer me reconhecia diante daquele reflexo.

Dei um tapa na minha cabeça e resolvi sair dali, era ridículo aquilo!

Após a prova, meu amigo Renan chamou-me a sua casa, aceitei, o mesmo perguntou se eu estaria doente, pois minha pele estava um pouco esbranquiçada, falei que era gripe, mas que mesmo assim, estaria disposto a ir.

Sua casa era um pouco pequena, porém o que mais me chamou atenção era uma pequena parede espelhada no corredor, eu precisava passar por ela para ir em direção ao quarto de Renan (ele queria jogar GTA IV comigo) . Ele foi na frente, fiquei um pouco temeroso, não sei o porquê, mas me sentia intimidado em passar. Renan chegou ao seu quarto e ficou me perguntando porque eu não passava.

Respondi que não estava meio bem, porém, o rapaz rapidamente veio em minha direção e começou a me puxar pelo pulso e em resposta, tentava soltar-me, ele me trouxe em frente ao espelho, entrei em pânico e comecei a me debater, só que minha visão foi ao reflexo, o de Renan estava normal, porém o meu estava um pouco escuro e tudo que podia ver de meu rosto eram meus olhos marcados por um contorno negro, o rosto me fitava igualmente, os olhos eram muito aterrorizantes, até que vi na sua boca um sorriso nervoso. Soltei um grito alto demais, Renan me soltou, caindo no chão atordoado, saí de lá, em pressa, voltei para o apartamento em pânico e tranquei a porta, já começara a anoitecer e tudo que fazia era tremer. Respirei fundo, fiquei ditando que era apenas coisa da minha cabeça e que não havia nada de anormal.

Passei sete dias ignorando o meu banheiro. Parece estranho? Se é. Como a única pia que funcionava era a do banheiro, comecei a comprar marmitas, cujo os talheres eram de plástico e mandava minha roupa pra lavandaria, fezes e urina? Apenas fazia no banheiro da minha escola (antes, eu nem passava por lá), dou graças a Deus que duas semanas atrás, tiraram o espelho de lá, pois o quebraram.

Voltei pra casa, senti meu cheiro, era degradante, tinha de tomar banho, relutante, fui. Peguei a toalha e embarquei no banheiro, de olhos fechados. Abri a torneira e deixei a água descer, enquanto me ensaboava. Apos o longo banho, cobri-me com a toalha e fui abrir a porta, só que no entanto, ela emperrou, desesperado, comecei a forçar a maçaneta, porém, nada adiantava, não olharia para aquela merda de espelho, continuei o trabalho, mesmo molhando o chão. Então decidi arrombá-la, quando usei o impulso da minha perna, escorreguei e a ultima coisa que vi foi um reflexo cair tortamente, com uma triste e melancólica expressão.

Acordei um pouco depois, senti um leve galo na cabeça, quando olhei de relance aquele maldito espelho, observei que o lado estava ainda mais alastrado, porém, em nenhum lugar em cima daquele espelho. Virei meu rosto, estava tonto devido a queda, só que dessa vez a porta abriu.

O que passou nas horas da noite foi uma forte febre que me abatera. Fiquei na sala, enroscado no lençol pois queria muito dormir, comecei a ouvir ruídos no banheiro, eram como passos, senti uma súbita friagem nos pés, eu evitei olhar em direção aquele cômodo, depois comecei a ouvir objetos se quebrando. E assim terminou minha noite.

Comecei a evitar qualquer coisa com reflexo, nem ao menos olhava nos olhos das pessoas, temendo o que veria lá, estava paranoico e beirando para sanidade. Por fim, decidi acabar com meu sofrimento, primeiro olhei o diário da minha irmã, e tudo que vi lá eram as descrições do reflexo dela a perseguindo de maneira horrorosa.

Agarrei o enorme martelo que havia na pia da cozinha e resolvi enfrentar o demônio. Prossegui apavorado, com martelo apoiado no ombro, abri lentamente a porta do banheiro. Ele estava intocado. Intocado? Que merda foi aquela que ouvi então?

Observei aquele espelho por uma ultima vez, o reflexo estava me intimidando, mordendo os lábios e me encarando friamente, ergui o martelo, nada fez a não ser me observar, e com toda a força que possuo, destrocei, caco por caco, enquanto observei-o cair da parede e ir de encontro no chão, dei um sorriso de vitória.

E escutei. Risadas e mais risadas e quando fixei o olhar para o chão cheio dos cacos, havia vários reflexos de mim, todos rindo frenéticos, como se tivessem um demônio dentro deles ou se eles fossem os próprios demônios, comecei a esmagar os cacos, mais e mais e as risadas prosseguiram e aumentaram...

E agora estou nessa cadeia, por vontade própria, sabe, aqui não tem espelhos e nem tenho companhia para ver nos olhos dos outros, o problema é que aqui faz muito calor, acho que é porque as paredes são acolchoadas demais.

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(Criado por CherryBell)

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